No ARION

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No oceano, em 2001, viajando entre a Terceira e S.Vicente (Cabo Verde)

terça-feira, 24 de maio de 2011

OS EQUÍVOCOS DE MARANATHA

OS EQUÍVOCOS DE “MARANATHA”


HELIODORO TARCÍSIO

Já tinha percebido que em “Maranatha” as mulheres são devolvidas à sua condição natural de fêmeas reprodutoras e ao seu sagrado papel de mães. Prolongado por muitos anos, tantos quantos os do seu período fértil pois foi dito “crescei e multiplicai-vos”. Quando lhes secarem as trompas de Falópio, poderão sempre desempenhar o papel de avós, uma espécie de mães reaproveitadas. Nada há a temer, por todo esse tempo, os seus machos proverão o sustento da família, a menos que sejam alcoólicos crónicos ou repatriados. Mas nesse caso, entrará em acção a Caritas, para matar a fome às pessoas. Seja como for, todos se encontrarão aos domingos na santa missa, onde entoarão em coro hinos mais ou menos afinados. E se desafinarem, isso não terá importância pois perdoar é divino e nem consta que Jesus cantasse.
Também já tinha inferido, aqui há tempos atrás, que em “Maranatha” recuaríamos uns quantos séculos e o ensino voltaria a estar nas mãos de entidades religiosas. Não fica claro quais seriam mas algo me diz que muçulmanas não (definitivamente), nem budistas, nem evangélicos nem hindus… Algo me diz que se trataria de colégios católicos e que teriam o medonho crucifixo pendurado na sala, por detrás da secretária do Mestre. “Do Mestre” porque se as mulheres, essas tentadoras, não servem para sacerdotes, também não devem dar para professores. Além disso, quem cozinharia o caldo de couves, varreria o chão do lar e limparia o rabiosque da petizada? Enquanto os homens fazem essas coisas chatas de homens, governar, caçar, jogar futebol, beber…
Agora fiquei também a saber que o primado da razão, nascido no calor da Revolução Francesa não passa de uma série de “equívocos”…Quando olho para a história da Humanidade, consigo ver um percurso evolutivo, do qual faz parte, indubitavelmente, a Revolução Francesa, com todos os seus excessos e até contradições. Ao decepar os alvos pescoços aristocráticos, a Revolução Francesa cortou também com as tradições do Antigo Regime.
Passemos aos “equívocos” de “Maranatha”: “Não é óbvio que antes da Revolução Francesa só haja ignorantes”. Eu teria usado a forma verbal “houvesse” mas o cerne da questão é que no Antigo Regime, a maior parte das pessoas era mantida na mais negra ignorância e a Educação era ainda dominada pelo clero, que a usava sobretudo para se auto perpetuar, transmitir os seus valores e… para dominar a sociedade, de parceria com as elites governantes. E já que falámos de Revolução Francesa, é justo referir que as autoridades católicas não cortavam as cabeças aos investigadores heréticos. De forma muito mais natural e até higiénica, preferiam queimá-los vivos.
“Não é óbvio que as habilitações académicas façam uma pessoa melhor”. Pois não… ainda assim, eu prefiro um malandro culto e educado. Se tiver de ser assaltado, prefiro que não me magoem e me peçam desculpa pelo incómodo, apelando para a minha compreensão. Precisamente o que está a acontecer com Sócrates e o seu Ministro das Finanças. Lá está, assaltam-nos mas são bem-educados e tentam explicar-nos as suas razões, ao mesmo tempo que nos aparecem na TV limpinhos e penteados. Através de uma educação universal, aberta e imparcial, podemos, pelo menos, evitar os muitos crimes cometidos por ignorância, parente próxima do fanatismo.
“Já passaram duzentos anos e não é óbvio que os modernos tenham sido bem sucedidos”.
Dêem-lhes tempo. Os Antigos tiveram milhares de anos e não criaram nenhum paraíso, antes pelo contrário, tivemos que lhes cortar as belas cabeças para pararem de vampirizar o povo. Duzentos anos são um grão num arrozal chinês.
A Humanidade está a mudar. Os erros ainda são muitos e não sei se vamos a tempo. Mas há muita consciência a germinar. E esta, apesar de tudo, foi semeada na Revolução Francesa e na liberdade ensanguentada que as suas guilhotinas nos legaram.
Na verdade, eu sou um reles plebeu, nascido no século XX, que teve acesso à Educação, sem ter que vestir uma sotaina. Desenvolvi a minha capacidade de análise, o meu espírito crítico e o meu livre arbítrio. É por isso que, raios e coriscos, tenho de confessar, há coisas em “Maranatha” que me atraem. Se por lá não se aprecia esta civilização tecnológica, vazia de fé, escravizada pelas teorias neo-liberais, metida em shoppings, intoxicada pelo espírito competitivo e dominada pelos senhores do mundo que negoceiam petróleo, armas, drogas, dinheiro, poder e influência, então, contem comigo. Isto é, se prometerem que não me crucificam e que não tentam converter-me, pois a minha curiosidade faz-me manter aberto a todas as verdades que me aparecem pela frente. Daí ser inconversível.
Agora, se em “Maranatha”, eu puder passar os dias, com tempo aprazível, sem alterações climáticas, vestido com uma simples toga branca por cima de uns boxers, vagueando placidamente, de praça pública em praça pública, sem horários, a discutir filosofia e depois houver alguém que, na hora da refeição, me sirva uma sopinha, uma frutinha, um iogurte, sem me exigir que trabalhe, então, meus caros, “Maranatha” é bom e eu quero mais. POPEYE9700@YAHOO.COM

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