SANJOANINAS 2006 (2)
Heliodoro Tarcísio
O Sr. Duarte Veríssimo assinou um artigo de opinião na edição de 13 de Julho do corrente do Diário Insular, intitulado “Trabalho ou divertimento ? “, em que critica veementemente um artigo da minha autoria, sobre as Sanjoaninas 2006. Devo dizer que fiquei satisfeito com a publicação desse artigo, que chegou apenas um pouco mais tarde do que eu esperava. Foi o próprio Diário Insular, através de nota editorial, a promover um debate público sobre o estado das Sanjoaninas e, naturalmente, um debate público é isso mesmo, um democrático e saudável confronto entre diferentes perspectivas, do qual poderá resultar algum ganho para todos nós e para o futuro das Festas.
Como certamente os leitores atentos compreenderão, sinto-me na necessidade de responder publicamente ao Sr. Veríssimo. Contudo, não faço questão de ter a última palavra nem de abrir aqui uma polémica que, essa sim, seria com certeza fastidiosa e inútil. Ficar-me-ei por aqui, desde que não me faltem ao respeito, bem entendido.
Apenas um pequeno reparo, o Sr. Veríssimo classifica o meu artigo de “extensivo” e “fastidioso”; queria dizer, com certeza, “extenso”, porque “extensivo” tem um significado bastante diferente. Era, com efeito, um artigo extenso, que o DI fez o obséquio de publicar em duas diferentes edições. Mas não vamos deter-nos em pormenores de qualidade semântica da nossa Língua. Quanto ao “fastidioso”, naturalmente trata-se de uma opinião pessoal; para que seja feita justiça, sugiro uma leitura comparada dos dois artigos.
Em termos gerais mantenho as minhas posições, especificamente sobre a minha adjectivação quanto às Sanjoaninas 2006, que classifiquei como fracas. Todavia, não creio estar sozinho neste campo. Não fui pesquisar mas lembro-me do próprio director do DI ter opinado em termos semelhantes em editorial. Aliás, só assim faz sentido a proposta de abrir um debate público. Por outro lado, vi outros artigos sobre as Festas deste ano e todos no sentido do meu. Além disso, ouvi inúmeras vezes expressa à minha volta a opinião de que as Sanjoninas têm vindo a baixar de qualidade, que o modelo está esgotado, e que este ano terá sido até mesmo, o pior de todos. Acrescento ainda que o feedback que recebi de algumas pessoas que me conhecem, relativamente às críticas que publiquei há dias atrás, foi no sentido da concordância e da identificação.
Por falar em identidade, tudo se torna mais claro quando o Sr. Veríssimo se identifica como membro da Comissão das Sanjoaninas 2006. O Sr. Veríssimo não gostou de ser criticado e fez a sua defesa. Nada mais natural e compreensível. É até mesmo um direito que lhe assiste. No entanto, talvez devido à sua confessada juventude, o Sr. Veríssimo poderá não ter ainda entendido que a crítica, desde que construtiva, bem intencionada e expressa com respeito e boa educação, é uma parte integrante e fundamental do processo de desenvolvimento e maturação das pessoas, instituições e sociedades.
Inteirei-me também, com muito gosto, do gargalhar do Sr. Veríssimo, visto que faz muito bem à saúde. E confesso que sou audaz mas, talvez por falta de inteligência da minha parte, tive alguma dificuldade em seguir o raciocínio, sem dúvida brilhante, do Sr. Veríssimo. Se bem entendi, só as pessoas que já fizeram parte duma Comissão das Sanjoaninas é que podem opinar sobre as Festas… Os restantes cidadãos são uma cambada de preguiçosos… Ora, se o próprio Sr. Veríssimo reconhece que estamos a falar de um reduzido número de cidadãos, sempre os mesmos, ficamos sem massa crítica, visto que todos sabemos que é extremamente difícil e pouco frequente alguém se auto-criticar.
Não vou aborrecer os leitores com considerações sobre o meu perfil hedonista, vocacionado para a fruição dos prazeres da vida; fui sincero ao confessar que nunca trabalhei nem ambiciono trabalhar nas Sanjoaninas. Contudo, abri o meu artigo com um enorme elogio às pessoas que o fazem. Muito convenientemente, o Sr. Veríssimo omitiu essa parte. Quanto a isso, só tenho uma coisa a dizer, tenho direito a expressar publicamente a minha opinião e continuarei a faze-lo. Ficamos conversados a esse nível.
Ainda no capítulo da omissão conveniente, quero chamar a atenção para o facto de que não me limitei a criticar; tentei descortinar algumas causas para os problemas e fiz algumas sugestões que terão certamente o seu valor relativo. Quem critica maliciosamente não faz sugestões mas o Sr. Veríssimo achou que também não valia a pena mencionar esses detalhes…
Além disso, em nome da verdade e porque não comecei agora a escrever nos jornais, gostaria de lembrar que em 2005, ainda nem tinham terminado as Festas e eu já tinha feito publicar um artigo no DI em que elogiava as Festas desse ano, chamando apenas a atenção para a limpeza da bacia interior do Cais da Alfândega. Não achei fracas as festas do ano passado, achei apenas que tinham menos gente a circular.
Fiquei também a saber que sou maníaco, isto é, que tenho manias, especialmente porque tenho a mania de comparar as Festas de Angra com as da Praia. Mas vou ter de acabar com isso, por intimação do Sr. Veríssimo. Ele acha simplesmente que são festas diferentes. Eu também acho.
Debrucemo-nos agora um pouco sobre o fenómeno “pimba”. Não fui ver o concerto do Emanuel do “nós Pimba” , graças a Deus, mas não duvido que o recinto tenha estado cheio… Nem duvido também que o mesmo aconteceria se viesse cá a Ruth Marlene do “pisca-pisca” ou o impagável Toy, o conceituado autor daquela coisa do “Aguenta-te com esta…” Agora, tenho formação suficiente para ser capaz de entender porque assim sucede. É uma verdade incontornável que somos uma sociedade já materialmente desenvolvida mas culturalmente ainda muito atrasada. Há imensos índices nesse sentido e por favor não me façam pôr a nu a vergonha nacional…A música que produzimos e consumimos, em termos de massas populares, é um reflexo dessa triste realidade. Curiosamente, o Sr. Veríssimo utiliza em defesa da música “pimba”, os mesmos argumentos das autoridades romanas relativamente à oferta de sangue derramado nas arenas dos circos romanos…”É disso que o meu povo gosta”…”. Posso entender que se traga gente como o Marco Paulo ou até o Tony Carreira, que, embora completamente fora do meu , acreditem, larguíssimo gosto musical, me parece serem herdeiros da tradição do cantor romântico nacional, da linha do Tony de Matos ou do António Calvário. Mas para mim há limites óbvios e continuarei a defender para os concertos das Sanjoaninas, um limite mínimo de qualidade que exclui, por completo, a música dita “pimba”.
É evidente que não vou rebater detalhadamente os argumentos do Sr. Veríssimo, isso ocuparia demasiado espaço e eu já defendi os meus pontos de vista no meu anterior artigo. Vou apenas clarificar dois ou três aspectos sobre os quais o Sr. Veríssimo lança a confusão. . Não tenho nada contra os Orishas ou o Boss Ac, antes pelo contrário. Critiquei sobretudo o alinhamento destas duas bandas para os últimos dois concertos e a escolha dos Boss Ac para o último concerto. Quanto ao Porfírio, na noite de S. João, não vejo o que possa ser “deplorável” na minha crítica e mais uma vez se confundem propositadamente as coisas. Adorei as noites de S. João animadas pelos “Coches” no passado. Conheço o Porfírio apenas de vista, já o ouvi cantar muitas vezes e mantenho a minha opinião: o Porfírio é dono de uma voz excelente, talvez mesmo excepcional mas não o considero um “músico” ou um “artista”; a sua escolha constitui uma opção óbvia e fácil, talvez causada pela falta de verbas. Se ele fosse realmente um “profissional” como insinua o Sr. Veríssimo, o mais certo, nesta altura do ano, seria estar noutra ilha ou no Continente, contratado para animar uma festa qualquer. Algo me parece estar a falhar na carreira dele… E agora quero confessar um lapso, esqueci-me realmente de referir a noite de fados, inovadora e com excelentes intérpretes e músicos, que conheço e admiro; pelo facto, apresento aqui as minhas públicas desculpas.
Não me vou alongar mais. Aguardarei ansiosamente nos próximos tempos pela publicação de perspectivas críticas diferentes das minhas, o que ainda não sucedeu até agora. Mas, por favor que sejam isentas e não venham da parte da Comissão de 2006, ou dos amigos e familiares deles. O que foi publicado no DI no dia 13 do corrente foi, inconfundivelmente, a defesa oficiosa de quem trabalhou nas Sanjoaninas deste ano. A grande confusão, provavelmente mais emocional do que maliciosa, reside no facto de se fazer parecer que eu ataquei essas pessoas, entre as quais se contarão, muito provavelmente, amigos ou pelo menos conhecidos meus. Nada mais erróneo, tenho a maior admiração por essas pessoas e deixei isso bem claro no meu artigo. A minha mensagem final é a mesma e duvido que vá mudar. Difícil ou não, é preciso recrutar outras pessoas, acabar com vícios e interesses instalados, que os há sem dúvida, seria a total ingenuidade pensar o contrário. É essencial também reflectir, definir um novo modelo e abrir as portas a novas ideias. Assobiar e olhar para o lado, não vai trazer bons resultados, de certeza. Desejo a melhor sorte para a Comissão das Sanjoaninas 2007 e que sejam umas festas de arromba. Conto estar por aí. Divertido mas bem atento.
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
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